16/08/2010 - A equipe do Fantástico percorreu todo caminho da pirataria: da fábrica até as prateleiras dos mercados populares. São R$ 40 bilhões que o Brasil perde todos os anos por causa da indústria ilegal. Um teste em laboratório comprova que a falsificação também prejudica a sua saúde do consumidor.
Nossos repórteres mostram quais são os caminhos que importadoras usam burlar a fiscalização e trazer para o país produtos ilegais por preços abaixo do mercado. Para mostrar imagens inéditas dos piratas em ação, entramos em uma fábrica de relógios clandestina.
Em uma oficina em Cidade do Leste, no Paraguai, sete homens produzem 30 mil relógios por mês. As marcas? As mais famosas do mundo.
“Aqui nós recebemos pedidos de brasileiros que vem de São Paulo pegar. Nós fazemos a marca que ele quer”, diz um dos homens da fábrica.
Todas as peças são importadas da China e param nos portos brasileiros. Depois, são transportadas de caminhão até o Paraguai. Por acordo assinado entre os dois países, o Brasil não pode inspecionar a carga.
”As peças vem separadas, tanto o mostrador, os ponteiros, as coroas, as caixas e as pulseiras, vem tudo”, explica o dono da fábrica.
O processo é artesanal. Feito por pessoas especializadas no ofício, com precisão. É possível observar como o momento de colar a marca é delicado.
O dono da fábrica, que prefere não ser identificado, recebe um dólar por relógio montado, só pela mão de obra. Ao fim do mês, arrecada o equivalente a R$ 54 mil.
“Por que a montagem é feita no Paraguai e não no Brasil?”, pergunta o repórter.
“Eu acho que é porque aqui é mais barato, a mão-de-obra é mais barata e a fiscalização também é menor”, responde o dono da fábrica.
Depois de embalados, os relógios são passados para os chamados atravessadores, que cruzam a fronteira.
“Tem que passar pela ponte, tem uns que passam pelo rio”, explica um deles.
A polícia e a Receita Federal desenharam a rota dos produtos piratas. De Foz do Iguaçu a mercadoria é levada para São Paulo, de onde é distribuída para todo Brasil.
Em São Paulo, os repórteres encontram relógios semelhantes aos produzidos no Paraguai. Só no ano passado, a Receita Federal apreendeu R$ 46 milhões em relógios contrabandeados.
Outro produto popular no Centro de São Paulo é a escova de dentes. À olho nu, elas são iguais às originais, até na embalagem. Os piratas têm uma técnica para conquistar o mercado: chegam a misturar escovas falsas às verdadeiras.
“O povo das farmácias fazem assim: eles compram um pouco de uma e um pouco da outra, aí mistura e vai embora. O povo não desconfia, é igualzinha”, conta comerciante.
Um revendedor explica como a fraude funciona. O segredo está no detalhe da falsificação: “o importante, hoje em dia, de você verder a Oral B é ter o código de barras. Se tem o código de barras, já era”.
Assim como os relógios, há escovas chinesas que chegam ao Brasil via Paraguai. Na Cidade do Leste, nossa equipe encontra uma fornecedora. Ela confirma que o produto é falso.
“Ela é primeira linha, ela é réplica perfeita, vem igual a do Brasil. Mas original não tem não. São todas chinesas”, afirma a vendedora.
Levamos as escovas para um teste no laboratório da Associação Brasileira de Odontologia e a conclusão é que elas são um risco para a saúde. As cerdas têm um péssimo acabamento.
“São pequenas lâminas, que você vai perceber, que vão entrar em contato e corta a gengiva.”, explica Heitor Panzeri, da Associação Brasileira de Odontologia.
Além da réplica da marca original, a vendedora também apresenta outra opção: “tem uma que é parecida com Oral B, tem o mesmo desenho. Só muda o nome”, diz revendedora.
Existe a cópia industrial, uma forma mais sofisticada de burlar a fiscalização e enganar o consumidor.
“É a sofisticação da falsificação. Não está falsificando a marca, mas falsifica o produto. O desenho industrial do produto está sendo falsificado”, esclarece Edson Luiz Vismona, do Fórum nacional Contra a Pirataria.
Seu Chadi, o barão das escovas de dentes Juliana. Dono da maior distribuidora da Cidade do Leste. Ele diz que seu produto é feito na fábrica da Colgate e da Oral B, na China.
As escovas são cópias descaradas dos modelos das principais marcas do mercado brasileiro. Chadi tenta convencer os repórteres que o produto dele é melhor do que qualquer réplica.
De acordo com a investigação de um escritório de inteligência de mercado, que defende as marcas que criaram os modelos originais, Chadi movimenta US$ 6 milhões por mês, despejando no Brasil dois milhões de escovas.
Em São Paulo, a escova Juliana é um sucesso. Juliana, que nunca foi certificada pela Associação Brasileira de Odontologia, também foi reprovada no teste da associação brasileira de odontologia.
A Associação Brasileira de Farmácias e Drogarias diz que desconhece a comercialização de escovas piratas. Na embalagem da Juliana, a falsificação é tão grosseira que até a língua portuguesa é desrespeitada.
Um perigo ainda maior para a saúde são os remédios falsificados.
“Ninguém compra um remédio sabendo que é falso. Aí pode ter implicações, com certeza terá, na saúde das pessoas”, alerta Heitor Panzeri.
Na Cidade do Leste, os repórteres do Fantástico encontram remédios para disfunção erétil. A vendedora nega que sejam falsificados. Mas a autoridade fiscal assegura que o Paraguai não fabrica esse tipo de medicamento.
“Com certeza, 100% dos produtos para impotência são de origem da China. O Paraguai não tem os elementos e nem a indústria para finalizar esses produtos”, informa Julio Garay, da Associação Brasileira de Combate à falsificação (ABCF).
O remédio Pramil que a vendedora oferece não é legalizado no Brasil. Mas é encontrado facilmete no Rio, em São Paulo e em outras capitais.
A vendedora ainda facilita a entrega: “Pramil é o que mais se leva. Por atacado é US$ 2,90. O senhor tem MSN?”, pergunta a vendedora novamente.
Acompanhamos uma operação da Polícia Rodoviária Federal em Foz do Iguaçu. Em um dos primeiros ônibus inspecionados, os agentes encontram medicamentos para impotência sexual.
“Já tivemos apreensões da ordem de 140, 150 mil comprimidos desse tipo. Ocorre muito isso, passageiros de ônibus, de automóveis levando pequenas quantidades, mil comprimidos, isso é constante”, diz Marcos Pierre, inspetor da Polícia Rodoviária Federal.
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